Ano 10 - Nº 10 - 1/2016

A ÉTICA PROFISSIONAL NO ENSINO DE LÍNGUAS: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

Muitas vezes, sem sequer se aperceber disso ou sem ter capacidade para o exprimir, o mundo tem sede de ideal ou de valores a que chamaremos morais, para não ferir ninguém. “Cabe à educação a nobre tarefa de despertar em todos, segundo as tradições e convicções de cada um, respeitando inteiramente o pluralismo, esta elevação do pensamento e do espírito para o universal, e para uma espécie de superação de si mesmo.
(Delors, 1996: 56)

RESUMO
A ética profissional no âmbito docente tem uma trajetória relativamente recente se comparada com outras áreas como o Direito e a Medicina. Todavia, a importância do papel do professor como agente ético na sociedade vem se destacando cada vez mais no cenário mundial e no Brasil em particular. O interesse pelos Direitos Humanos e por uma educação mais acorde com os novos tempos desencadeou no passado século reflexões que serviram como ponto de partida a iniciativas dentro das políticas educativas. Embora a aplicação destes princípios e valores ainda amostre campos que podem ser melhorados, pensamos que o breve percurso pela historia da ética docente no Brasil aqui acenado possa servir como elemento propulsor para a reflexão e o aprimoramento da prática docente ética.

Palavras-chave: ética profissional; prática docente; reflexão; educação.

ABSTRACT
Ethics regarding teaching profession has a considerable recent path when compared to other areas like Law or Medicine. However, the importance of teachers' role as ethical agents in society has been growing both in global arena and in Brazil. The interest over Human Rights and education aligned with this contemporary world triggered, in the last century, thoughts which were the starting point to actions within educational politics. Although the application of these principles and values has already shown they can be improved, we agree that the brief course through the history of ethics in teaching profession in Brazil presented in this paper may be an element which can drive us to think further about this issue and improve an ethical teaching practice.
Keywords: professional ethics; teaching; reflexion; education


Introdução
A Ética como conceito possui uma tradição que se remonta aos primórdios da filosofia. Distanciando-se da “metaética” (que analisa a linguagem moral) e da “ética normativa”, a ética docente se inclui dentro da chamada “ética aplicada”, que se ocupa de estudar questões morais concretas e em certo modo controvertidas. Dentro dela, ainda, se encontra a “deontologia profissional”, que busca justificar os valores morais que deveriam guiar aos profissionais, além de estudar quais valores, de fato, guiam a prática profissional. Trata-se, portanto, de uma disciplina normativa e filosófica, mas também descritiva e em consequência, científica (AUDI, 1999: 749 e 284-323). 

O termo “deontologia” (do grego, deontos) foi acunhado em 1834 por Jeremy Bentham e tomando como base a característica normativa dos imperativos, faz referência ao estudo geral da moralidade com ênfase nos deveres e nas obrigações de conduta (apud DURAND, 2010).

Na opinião de Sanches Vázquez (2003), a Ética “não soluciona diretamente os problemas disciplinares, mas reflete de forma científica e aprofundada da prática moral”. O estudo da ética não pretende estabelecer regras fixas sobre como se comportar, isto é, soluções para cada problema prático-moral. O que visa é “criar uma ciência com princípios gerais voltados para a reflexão de um comportamento moral e, assim, saber agir em situações problemáticas”. A ética não tem seu interesse no comportamento humano, mas nos conflitos que envolvem problemas de moral, ao tempo que promove a reflexão sobre estes problemas. Com isso, persegue a construção de uma ciência, que tem como objetivo o comportamento moral: “Quando se pensa em solução de problemas com ética, não significa dizer que a ética tem regras para todos os comportamentos humanos em cada situação concreta, pois a solução é de cada individuo” (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2003: 17, apud JUNIOR, RUBIO e MATUMOTO, 2009: 150).

Porquanto a ética parte de um posicionamento diante do “Outro”, ela faz uso da reflexão sobre os valores, ao tempo que define e/ou discute um conjunto de princípios e normas. O saber ético sempre permeou as ações humanas, mas sua aplicação às profissões é relativamente recente. Será subsidiária, em primeiro lugar, do surgimento de uma consciência social do valor do ser humano e do impacto da educação em massa (séculos XVIII-XIX) na formação desses mesmos seres. Nesse momento surgirão os códigos deontológicos pioneiros do Direito e da Medicina.

Desde uma perspectiva histórica, a ética profissional docente decorre, em segundo lugar, portanto, da construção de uma “identidade profissional” e neste sentido, é consequência da concepção do Ensino como Profissão e da aparição de conselhos, associações e sindicatos. Em terceiro lugar e não por isso menos importante, a criação do ethos Profissional é consequência da implantação de Políticas Educativas. De alguma maneira, é filho delas e da História do Ensino; ambas se nutrem mutuamente e, por isso, a Política constitui uma das dimensões a tomar em conta na formação:

Os desígnios de uma política de ensino de idiomas no país estão inscritos como uma das cinco dimensões em que se discutem a formação e atuação de professores e aprendizes no contexto escolar e universitário. São elas: (1) o contorno e raízes de uma tradição espontânea na forma de uma cultura de ensinar e aprender idiomas não desvinculado de um certo caráter nacional que afeta de algum modo o ensino de línguas, (2) o confronto da tradição de crenças e memórias com uma teoria relevante de ensino de línguas e de formação de professores, (3) a interpretação da história de ensino e aprendizagem de línguas no país, (4) a construção de um código de ética orientador da profissionalidade e suas práticas e (5) a construção e operação de uma política deliberada e abrangente do ensino de línguas. (ALMEIDA FILHO, 2015: 126)

Na aplicação da ética às profissões e ao processo de profissionalização, resulta evidente que qualquer profissão que reclame legitimidade deve ter fundamentos técnicos suficientes para sustentar dita reclamação, isto é, deve ter um âmbito bem delimitado, possuir requisitos para a formação de seus membros e convencer ao público de que seus serviços são especialmente confiáveis. Blankenship (1977: 5) sintetiza estas ideias em alguns traços concretos: um código ético; diplomas e certificados; centros de formação; conhecimento especializado; autorregulação; valor de serviço público; e os colegas como grupo de referência principal (apud VAILLANT, 2007: 4). Dentre os componentes da “profissionalidade”, Bolívar acrescenta à ética profissional a dimensão do compromisso ativo no serviço à cidadania:

Por tanto, las instituciones de educación superior deben contribuir a que los futuros profesionales desarrollen una visión y sentido moral, que pueda guiar su práctica y refleje en sus acciones un conjunto de virtudes morales. Ello fuerza a preparar a los profesionales, y especialmente a los educadores, a comprender las complejidades éticas y morales de su papel, para tomar decisiones informadas en su práctica profesional (BOLIVAR, 2005: 9).

Diferentemente de outras profissões, o magistério, “em virtude de sua majoritária condição de assalariado dependente, não possui propriamente esse estatuto, apesar de ter incorporado nos últimos anos valores próprios das profissões liberais” (CUNHA, 1999). 

No Brasil, a política manifesta nos Parâmetros Curriculares Nacionais propõe que a ética seja incutida na formação docente de maneira transversal:

Nos PCNs estão inclusos também alguns temas – os chamados temas transversais – que são considerados fundamentais para a sociedade brasileira. Estes expressam conceitos e valores importantes à democracia e à cidadania e são bem amplos de modo a suscitar o debate na sociedade. São eles: Ética, Meio Ambiente, Saúde, Pluralidade Cultural e Orientação Sexual. No caso da Educação de Jovens e Adultos, a Resolução CNE/CEB nº 1, de 5 de julho de 2000, estabelece Diretrizes Curriculares Nacionais. É fundamental que um profissional da Educação tenha conhecimentos sobre a legislação que respalda a oferta de EJA (dos SANTOS, 2010: 43).

Os anos recentes vêm dando maior atenção a estes assuntos pela premência de desenvolver soluções que minimizem os efeitos de uma má gestão dos conflitos e da disciplina, não só em aula com os alunos, mas também nas relações do professor com as diversas instâncias com as quais se relaciona: colegas, pais de alunos, instituições de ensino, sindicatos de professores, leis e políticas de educação, e assim por diante.  Embora se tenda a pensar que é possível uma aplicação vertical ou coercitiva dos princípios e valores éticos, a realidade demonstra maior sucesso nas soluções particulares em dependência de cada caso e pessoa.

Algumas variáveis confluem para desenvolver este processo de profissionalização e interesse pela ética. Por uma parte, a dimensão do professor como educador, e a dimensão particular de cada caso ético. Não podemos esquecer que a educação é, em essência, um direito humano, exercido pelo cidadão no exercício das suas faculdades, e promovido pelo governo em cumprimento às normativas internacionais que velam pelo desenvolvimento sadio do indivíduo. Em decorrência destes fatores, e pela dependência das políticas e da sociedade que seu cargo tem, o docente deve ficar atento às inovações,

Ética porque o professor deve agir na observância de um conjunto de princípios de natureza moral e também porque o que se espera do professor é que ele recorra a uma estratégia, desenvolva um método e disponha de recursos para promover a formação ética dos alunos. (CAETANO e SILVA, 2009: 50).

Outro vector que deve ser considerado é a inserção da tecnologia nas atividades humanas, pois modifica o cenário e os tipos de interação:

A partir da Revolução Tecnológica passaram a prevalecer os contatos secundários, impessoais, formais, utilitários, calculados mais como um meio para se atingir um fim. Intensifica-se o uso da modalidade denominada Educação a Distância – EaD. Essa alteração nos tipos de contatos sociais muda os atributos necessários para preservar a Ética nas relações educativas (dos SANTOS, 2010: 27).

A partir da definição que a ONU deu em 1984 dos ideais de desenvolvimento humano na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no campo da ética docente, em Portugal aparecem diversos Estatutos da Carreira Docente, e, sobretudo, a Declaração Internacional da Educação sobre ética profissional, que pretende ajudar aos docentes a responder questões relativas à sua prática profissional na conduta e aos potenciais conflitos que podem surgir entre os diversos agentes educativos (IE, 2004). (BAPTISTA, 2011: 23). Outros Códigos se encontram nas Filipinas, Índia , etc.

A ética profissional se administra hoje em algumas universidades do mundo como uma competência específica de nossa profissão: México , Caribe , Espanha , Argentina , República Dominicana , Chile  e os EUA, entre outros, contam com matérias sobre ética profissional na formação docente. Alguns conselhos contam com Códigos de Ética como o de Costa Rica . A Universidade de Cantábria, na Espanha (2015) a entende como “o respeito e a promoção dos direitos fundamentais e de igualdade entre homens e mulheres, dos direitos humanos e os princípios de acessibilidade universal e desenho para todos, e dos valores próprios de uma cultura de paz e de valores democráticos” .

É preciso salientar que a mera discussão da legislação não basta para consolidar uma etapa pedagógica, dado que a doutrinação do indivíduo não promove necessariamente o desenvolvimento de habilidades morais autônomas, isto é, o conhecimento detalhado das normas e a capacidade cognitiva de reconhecê-las não servem como garantia de que tais normas se reproduzam nas atitudes cotidianas individuais:

As a glance at teaching and educational curricula reveals, the subjects which deal with moral education (such as ethics, religion or even also German) are onesidedly biased towards increasing the knowledge of moral concepts, which can be easily examined, but has little to do with the behaviour of people towards each other. (LIND, 2011: 5).

Para Perrenoud o professor profissional seria: 

uma pessoa autônoma, dotada de competências específicas e especializadas, que repousam sobre uma base de conhecimentos racionais, reconhecidos, oriundos da ciência, legitimados pela universidade, ou de conhecimentos explicitados, oriundos da prática. Quando sua origem é uma prática contextualizada, esses conhecimentos passam a ser autônomos e professados, isto é, explicados oralmente de maneira racional, e o professor é capaz de relata-los (PERRENOUD, 2001: 25).

Em consequência, devemos salientar que, embora a dimensão humana e global da ética docente conviva necessariamente com a deontologia, não se reduz a ela. A ética profissional pode ter seu embasamento em um sólido arcabouço teórico, mas encontra seu autêntico sentido na prática e, por isso, vai além do cumprimento de normativas ou do temor à punição: “O engajamento ético difere da obediência às regras; ele se situa em uma vertente que não é a mesma das prescrições, exortações e práticas morais, a ponto de não ter receio de transgredir tais prescrições e práticas” (IMBERT, 2001: 14). Mota ressalta em linhas semelhantes que “a formação técnico-científica, sem a formação ética, pode levar o profissional ao tecnicismo” (MOTTA, 1984, apud VASCONCELOS e BERBEL, 2000: 4). Neste sentido, e dado que se trata de um componente em permanente construção dentro do indivíduo, podemos falar da convivência de diversas éticas, nos outros e em nós mesmos.

Aproximação à História da Ética Docente no Brasil

A dimensão ética da profissão docente vem sendo objeto de estudos e pesquisas como as de Cunha (1996), Altarejos et al. (1998), Veiga e Araujo (1998, 1999, 2005), Tardif e Gauthier (1999, 2000).

Com a profissionalização do ensino, e o surgimento de associações ao longo do século XIX e XX, a vocação de professor de línguas atinge novos patamares. A internacionalização e a globalização obrigam a uma permanente atualização e a atingir parâmetros de qualidade equiparáveis com os exigidos a nível mundial. Cullen resume as principais fases em poucas linhas:

la educación moral ha pasado por diversos períodos: una época de fuerte influencia religiosa hacia los siglos XVIII y XIX cuando nace la escuela masiva moderna (Escuelas jesuitas); una fuerte reacción de la tradición laica para instaurar los valores propios de la formación de los estados nacionales (s. XIX); un positivismo pedagógico que pretendió entregar una “moral sin dogmas” en el marco de una sociedad ansiosa de progreso y bienestar, basados en el supuesto de que el conocimiento no entraña formación moral (neutralidad axiológica); más tarde se pensó que la ética no era objeto de enseñanza, y se optó por el “emotivismo” y el “decisionismo” (“la cuestión moral es una cuestión de conciencia de cada uno”), llegando también a un “formalismo ritualista en la educación cívica”; surgió también una reacción “espiritualista axiológica” al positivismo factualista, asociada a las posturas emotivistas; la sucedió una moral escolar “basada en la autoridad del maestro, en los alumnos ejemplares, los aplicados y de buena conducta, en los modelos de honestidad y amor a la patria de nuestros héroes y en el cumplimiento estricto de reglamentos y circulares. Por su parte, la Escuela Nueva (inicios del s. XX) cuestionó seriamente el disciplinamiento normalista de la escuela tradicional y quiso abrir la escuela a la vida y a la sociedad (CULLEN, 1997: 199)

A deontologia do magistério, segundo Veiga (1999: 101-126), data do sec. XIII com os escritos de Santo Domingo de Gusmán e São Tomás de Aquino. Muitos séculos depois, só em 1960, a Associação Americana de Professores Universitários (AAUP) publicará uma Declaração sobre ética profissional. Nela estabelece a conveniência de que o educador seja uma pessoa moralmente íntegra com os alunos, que assuma o ensino com responsabilidade e competência profissional; além disso, sua honestidade acadêmica será exibida na justa avaliação dos alunos; é claro que, dado que seu trabalho se realiza num contexto social, o profissional da educação deve evitar a exploração dos estudantes.

No Brasil, em 1826 se apresenta na Câmara dos Deputados o primeiro projeto de ensino público. Ele prevê que o aluno deveria possuir “conhecimentos morais, cívicos e econômicos”. Porém, um currículo nacional que elencasse matérias só surge em 1909 e nele a educação moral não aparece como conteúdo. 

Em 1942, a Lei Orgânica do Ensino Secundário inclui termos como “formação da personalidade integral do adolescente” e a elevação da “formação espiritual, consciência patriótica e consciência humanista” do aluno. Em 1961, a Lei de Diretrizes e Bases do Ensino Nacional coloca entre suas normas a “formação moral e cívica do aluno”. Dez anos depois, em 1971, a Lei n. 5.692/71 institui a Educação Moral e Cívica como área da educação escolar no Brasil (BRASIL, 2000: 72), mas não se tem indícios de seu sucesso. 

A Constituição da República Federativa do Brasil (1988) supõe um dos primeiros documentos de base na configuração de um horizonte ético docente e neste sentido, abona o terreno para as políticas que a partir dela decorrerão. Reúne elementos que remarcam a importância de que, ao agir perante os outros, se respeite sempre a dignidade, sem humilhações nem discriminações em relação a sexo ou etnia (BRASIL, 2000: 70) . O art. 3° expõe como objetivos: I) construir uma sociedade livre, justa e solidaria; III) Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV) Promover o bem e todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer formas de discriminação; no título II, art. 5° se esclarecem algumas normas morais: I) homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações; III) ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; VI) é inviolável a liberdade de consciência e de crença; X) são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (...) (BRASIL, 2000: 70).

Em meados da década 1990, a Educação brasileira investiu na construção de Parâmetros e Referências Curriculares Nacionais elaborados por equipes de educadores nacionais e internacionais, que definiram diretrizes curriculares para a Educação Infantil, o Ensino Fundamental de 2º ao 9º ano e para o Ensino Médio, e que inseriram, além das disciplinas de conteúdos essenciais para a formação do cidadão, orientações para discussões sobre ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual, pluralidade cultural, concomitante às disciplinas do currículo escolar, denominadas temas transversais. A inclusão desses temas nas práticas pedagógicas das escolas brasileiras de Ensino Fundamental e Médio pretenderam resgatar a dignidade da pessoa humana, a igualdade de direitos, a participação ativa na sociedade e a corresponsabilidade pela vida social (FOGAÇA E NUNES, 2007: 73).

E ainda

Os Temas Transversais (BRASIL, 1998), que complementam os PCNEF (BRASIL, 1998), propõem uma educação para a cidadania por meio de questões sociais para a reflexão dos alunos, temas que podem ser contextualizados e priorizados conforme as diferentes realidades locais e regionais. O documento aprofunda o debate sobre a questão da cidadania, relacionada “com a discussão sobre o significado e o conteúdo da democracia, sobre perspectivas e possibilidades de construção de uma sociedade democrática” (p. 20). A noção de cidadania trazida pelos Temas Transversais amplia a compreensão do cidadão como portador de direitos e deveres para alguém que produz tais direitos e cria condições para a possibilidade de participação da gestão pública. O documento aponta para a necessidade de transformação da sociedade em suas dimensões econômica, política e cultural, elegendo para isso os seguintes princípios: dignidade da pessoa humana; igualdade de direitos; participação (cidadania ativa) e co-responsabilidade pela vida social. Os temas sugeridos são a ética, a pluralidade cultural, o meio ambiente, a saúde, a orientação sexual, e o trabalho e consumo (FOGAÇA E NUNES, 2007: 175).

No caso do Brasil, os direitos e deveres dos profissionais da educação costumam ser prescritos pelo Estado através de legislação educacional e estatutos do magistério. Neste ponto é dever lembrar os Encontros Regionais da Anfope (centro-oeste, sul) e Encontro Nacional em Campinas, de 1998. Nestes encontros foram apontadas questões cruciais para a profissionalização da docência, tais como a regulamentação da profissão e a construção de um código de ética (VEIGA, 1999: 120, apud VASCONCELOS& BERBEL, 2000: 11).

Segundo Gimeno Sacristán, os controles éticos são próprios e necessários no caso de profissões cujas atuações têm consequências morais e, ainda mais se envolvem decisões de risco (GIMENO SACRISTÁN, apud CUNHA, 1999). “As profissões que não possuem a sua Deontologia, como é o caso do magistério no Brasil, ficam sujeitas aos deveres de ordem geral, ditados pela Ética Profissional” (VASCONCELOS& BERBEL, 2000: 11).

Em resumo, a definição do perfil profissional por parte da formação de professores no Brasil salienta nos anos 70 que a formação preparasse o professor técnico. Já nos anos 80 se propendeu para que o professor fosse um transformador da sociedade. Hoje se enfatiza a formação do professor-pesquisador com constante correlação entre a experiência cotidiana de sala de aula e a avaliação reflexiva da mesma (PEREIRA, 2000, apud VEIGA e ARAUJO, 2007: 42).

Segundo Silva e Farias (2009) desde o século passado está em curso políticas de formação de professores no Brasil (KÜENZER, 1999) dentro de novos modelos de formação para o trabalho docente. No que se refere à ética na política educacional, já no final dos anos 1990, o Ministério da Educação (MEC), lançou os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Direcionados para as séries iniciais do Ensino Fundamental (1997) indicavam objetivos a serem atingidos, conteúdos, metodologias de trabalho, e até forma de avaliação das práticas educativas. Além das disciplinas curriculares, dá espaço aos temas transversais (ética, pluralidade cultural, meio ambiente, saúde, orientação sexual e temas locais). Quando se diz que esses temas devem ser trabalhados de forma transversal e interdisciplinar significa que eles perpassam todas as práticas pedagógicas escolares. \

O documento ressalta a “importância da escola na formação ética das novas gerações” (BRASIL, 1997, p.65). Dentre os conteúdos a serem trabalhados estão o respeito mútuo, a justiça, o diálogo e a solidariedade, mediante a proposta de atividades “que levem o aluno a pensar sobre sua conduta e a dos outros” (IDEM, p.69). 

No Brasil, com esse intuito e com o fim de dar maior qualidade às licenciaturas, o MEC, através da LDB de 1996 extinguiu a obrigatoriedade de currículos mínimos para colocar em seu lugar as diretrizes curriculares, que foram elaboradas segundo os seguintes princípios:
- Assegurar que as instituições de ensino superior possuam ampla liberdade para compor a carga horária que deve ser cumprida para integrar os currículos, assim como na hora de especificar as unidades de estudos que devem ser ministradas;
- Indicar os tópicos e experiências de ensino-aprendizagem que compõem os currículos, evitando a fixação de conteúdos específicos com cargas horárias pré-determinadas, que não poderão exceder 50% da carga horária total dos cursos;
- Evitar que se prolongue desnecessariamente a duração dos cursos de graduação;
- Incentivar uma sólida formação geral, necessária para que o futuro graduado logre superar com sucesso as mudanças nas condições de exercício profissional e na produção do conhecimento; permitir variados tipos de formação e habilitações em um mesmo programa;
No que tange à definição da ética no âmbito docente, o documento ressalta que a ética pode ampliar o cognitivo e desenvolver o respeito das diversidades de conteúdos disciplinares (PCNs, 1997).

A grande importância dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs, MEC, 1997), foi traçar um novo perfil social e humanizado, muito mais crítico e construtivo. O Brasil acabava de sair de diversos conflitos políticos anteriores a 1997, regidos por uma sociedade cheia de indignações e rebeldias. O caminho encontrado para convertê-la numa nova abordagem, foi através da Educação, com visão crítica, construtiva, criadora, em busca do equilíbrio nos campos Político, Religioso e Científico, sendo mais solidária, justa e dialogada (TADEUS, CUNHAS, 2009, apud SILVA e AZEREDO, 2013:132).

Vale a pena frisar três conceitos importantes e de plena atualidade no panorama docente: a Estética da Sensibilidade, a Ética da Identidade, e o Fator Emocional, (Brasil (1998), anterior a atual Resolução CNE/CEB 2/12, de 31 de janeiro de 2012; “Resolução CEB Nº 3, de 26 de junho de 1998 - as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio”). Os Parâmetros Curriculares Nacionais na edição de 2000 reforçam estes princípios para a legitimação dos valores e regras morais, sob a dimensão da afetividade (como sensibilidade) e a racionalidade. Ambos os fatores se articulam e promovem o desenvolvimento moral através da socialização (BRASIL, 2000: 86).

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais encontramos que a ética “interroga sobre a legitimidade de práticas e valores consagrados pela tradição e pelo costume. Abrange tanto a crítica das relações entre os grupos, dos grupos nas instituições e perante elas, quanto a dimensão das ações pessoais” (BRASIL, 2000: 30). Na escola o tema da ética se encontra de maneira tripla: nas relações entre os agentes, nas disciplinas do currículo (implícita ou explicitamente) e nos temas transversais (ibidem, 32). De uma parte, desde uma perspectiva didática, a ética se constitui em um assunto transversal, isto é, liga a teoria e o aprendizado da e na realidade; de outra parte, que lida com uma abordagem epistemológica, se concebe como interdisciplinar (ibidem, 40). O documento destaca que estas questões sejam tratadas de maneira “contínua e integrada” (ibidem, 36). O educador, enquanto cidadão, precisa se desenvolver como sujeito crítico da realidade que habita, reconhecendo seus direitos e deveres para uma adequada valorização profissional (ibidem, 52).

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da Educação Básica, Parecer CNE/CP nº 009/ 2001, articuladas em forma de competências, afirmam que as licenciaturas devem pautar-se “em princípios da ética democrática para atuação dos professores como profissionais e cidadãos” (CNE, 2001, p. 41), ao tempo que adverte que estes devem “zelar pela dignidade profissional e pela qualidade do trabalho escolar sob sua responsabilidade” (IDEM, 2001). Nesse mesmo documento encontramos ainda que ao longo da formação os futuros professores possam “exercer e desenvolver sua autonomia profissional e intelectual e o senso de responsabilidade, tanto pessoal quanto coletiva – base da ética profissional” (IBIDEM, p.53).

O documento das Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia nº 1/2006 (CNE/CP 1/2006) corrobora estas formulações quando explica que o estudante trabalhará com conhecimentos teóricos e práticos, “fundamentando-se em princípios de interdisciplinaridade, contextualização, democratização, pertinência e relevância social, ética e sensibilidade afetiva e estética” (Art. 3º, inciso I). Acrescenta que o egresso do curso deverá “atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa” (Art. 5º, inciso I) (...), na “aplicação em práticas educativas, de conhecimentos de processos de desenvolvimento de crianças, adolescentes, jovens e adultos, nas dimensões física, cognitiva, afetiva, estética, cultural, lúdica, artística, ética e biosocial”, merecendo “atenção as questões atinentes à ética, à estética e à ludicidade, no contexto do exercício profissional” (Art.6º). 

Mais recentemente encontramos a proposta para construção da ética no ambiente escolar (BRASIL, 2007: 19-20) através de um “Fórum Escolar de Ética e de Cidadania” que conta com a colaboração do Ministério da Educação. O propósito é forjar um debate sobre temas atuais do cotidiano dos alunos, contando com a presença de profissionais da escola e a comunidade.

Uma constante nestas linhas de pensamento é a ideia de que ao longo da sua formação, o professor deve ser possuidor de saberes especializados em educação (pedagogia), em disciplinas pelas quais ele se responsabiliza e de experiência (NÓVOA, 1995: 25; SAUL, 1996: 122). Neste sentido, Perrenoud enfatiza que: “a profissionalização aumenta quando, na profissão, a implementação de regras preestabelecidas cede lugar a estratégias orientadas por objetivos e por uma ética” (PERRENOUD, 1997: 137).

Todos estes parágrafos apontam uma atenção sempre maior para a relação da ética e a educação, a ser desenvolvida pelo professor e os alunos, com foco nos deveres do exercício de sua profissão. Embora existam essas diretrizes na política educacional, as práticas profissionais qualitativamente éticas que acompanhariam essa reflexão ainda não estão ao nível da exigência.

Porém, a ética docente não se adquire de maneira imediata nem é uma construção pessoal ou individual. Antes se trata de uma composição histórica, social e cultural. É por isso que ela pode ser aprendida. De fato, a nosso ver, em cada individuo se solapam diversas éticas em formação, sujeitas a constantes modificações e renovações, conforme o médio social interage com o professor. Em resumo, como destacam Silva e Farias (2009), ainda a brecha entre teoria e prática na questão da aplicação de conteúdos sobre a ética dista de ser curta: 

a postura ética dos sujeitos da relação pedagógica deve transcender os ideais dos professores, os discursos sociais e oficiais e se manifestar na prática cotidiana da sala de aula. No entanto, conclui-se que a legislação trata a ética de forma pontual e imprecisa, sem indicar de fato como esta formação pode ser efetivada, sobretudo na Educação Superior (SILVA e FARIAS, 2009: 9488).

Neste âmbito, a formação é a chave, mas como as mesmas autoras comentam em outro artigo com Coelho (2008) “a formação continuada, como o próprio nome sugere, não pode se reduzir a momentos estanques, há que se assumir uma política permanente de formação que considere de forma problematizadora e dinâmica o contexto e as condições em que se dão o ensino”. (SILVA, FARIAS e COELHO, 2008)

Observando em linhas gerais, a ética docente no Brasil tem avançado muito em pouco tempo, mas muito ainda pode ser feito.

Perspectivas Éticas para um Mundo em Transição

A educação tem mudado muito nos três últimos séculos: na verdade, desde a invenção da  por Gutenberg (circa 1450), sabemos que a multiplicação de volumes escritos foi estendendo o privilegio da leitura além dos muros monásticos. Não obstante, a educação alcançou o estatuto de direito humano só no passado século, quando todos os países que acolheram estes direitos dentro da sua constituição, divulgaram e puseram em funcionamento políticas que pretenderam, em sucessivas , abranger o total da população sem segregações, o que constituiu uma autêntica revolução do conhecimento no seu sentido social.

Nessa evolução, as figuras do professor e do aprendiz têm tomado distintos nomes e adquirido novas funções. A prática individual passou a ser proporcionada em grupos. O ensino de todas as ciências (humanas todas, ) foi fragmentando os conteúdos para atender às crescentes descobertas. As pesquisas foram se profissionalizando. Os métodos foram também se adaptando aos diversos públicos e suas necessidades. Os materiais foram cada vez mais ricos pedagogicamente e conceitualmente. Assim, dentre os modelos de comportamento em sala de aula, muito tem mudado. Cada fase escolar requer um tipo de relacionamento: com crianças, com adolescentes, com adultos, e de fato a legislação e os métodos de ensino são diferenciados para cada faixa. É por isso que o docente constrói paulatinamente sua identidade profissional integrando as mudanças sobreditas.

É comum assistir-se no domínio ético à extrapolação da ética pessoal para a ética profissional. A atividade educacional não é exceção, muitos dos professores têm uma visão centrada em princípios e valores, orientadores da ação, que são comuns aos domínios pessoais e profissionais. Isto leva a que muitos docentes considerem a ética profissional como uma extensão da ética pessoal. Nesta ótica, a identidade profissional e pessoal formam um todo (SILVA e CAETANO, 2009: 53).

Porém, sabemos que existe uma formação espontânea e uma formação deliberada formal, e que a ética parece ser apreendida, sobretudo, pela situação (casos) e pelos modelos (e anti-modelos) e sua mimese, ou seja, pela prática do exemplo alheio. Assim, as experiências próprias aparecem apenas, na verdade, como co-construtoras da ética pessoal.

No contexto escolar a preparação de profissionais educadores deve estar pautada em referenciais éticos construídos a partir de reflexões acerca de situações do cotidiano, discussões dos valores, crenças, atitudes que desencadearam tal fenômeno, de maneira incessante, para que essa construção se enraíze e proporcione ao educando uma referência ética e moral. [...] O professor possui uma dupla função: como instrutor tem de mediar a construção de conteúdos, técnicas e habilidades para desenvolver o potencial de cada aluno; como educador tem a responsabilidade sobre o modelo de ser humano que apresenta ao aluno. Ele se oferece como paradigma, não para ser apreendido em sua personalidade, mas para ser um referencial e servir como modelo vivo de maturidade e autorrealização. (dos SANTOS, 2010: 28)

Para o sucesso dessa identidade profissional em construção, a formação precisa ser continua e estar dotada de um tempo para reflexão, na ação e sobre a ação (in-action e on-action).  (for and towards action):

Uma formação inicial que forneça fundamentos para a prática, que se constitua como uma formação rigorosa e organizada, motivadora para as questões éticas e que seja ela própria uma experiência onde se vive a ética. Uma formação contínua que, numa fase em que poderá haver mais sensibilidade para o tema, permita colmatar a distância entre a teoria e a prática, pela consciencialização de si próprio, que crie condições nas quais os professores possam parar para pensar, que mobilize o tratamento de temas atuais, que ajude a gerir relações de grupo e que oriente a formação ética dos alunos. (SILVA e CAETANO, 2009: 54)

Voltando nosso olhar para o ensino de línguas, pode-se perceber que os avanços técnicos rapidamente desenvolveram aparelhos e mecanismos para facilitar, ampliar e melhorar o número e exposições a estímulos visuais e auditivos em outra língua: fitas cassete, vídeos VHS, aparelhos de som, as possibilidades da projeção (slides, PowerPoint, vídeos). A paulatina popularização destes recursos permitiu que, se antigamente só uns poucos 

Por outra parte, no século XX, as descobertas da psicologia, da neurologia e do cognitivismo supuseram uma mudança considerável para as ciências humanas. Recentes tendências salientam o papel da motivação, da atenção e das emoções no processo de ensino/aprendizado. Em continuidade com estas tendências, o aprendizado a distancia, o blended learning, as flipped classrooms, e muitos outros novos conceitos vêm colocando o aluno como foco e coautor do próprio aprendizado, relegando ao professor à função de mediador ou facilitador do processo.

O que o sistema de educação brasileiro oferece já é uma boa plataforma, se for cumprido. Não obstante, para que as belas palavras saltem do papel para a realidade, o docente precisa de reflexão, valores vividos, atenção ao aluno, autoavaliação, além de um sólido razoamento quando se pretende elaborar, fundamentar e defender una decisão ética. Os possíveis conflitos éticos devem ser identificados e analisados para tomar medidas preventivas. Aliás, precisam ser resolvidos um por um, sem se limitar com noções preconcebidas.

Se o sistema vem delegando suas funções no professor por considerá-lo qualificado (e isso não parece contraproducente), também seria responsabilidade desse governo prover as ocasiões e recursos para uma formação profissional continuada. Em geral, os sistemas educativos se orientaram nas últimas décadas para um ensino aplicado, material e prático, descuidando às vezes uma formação inicial de mais ampla base, mais humanista, na qual a filosofia ensina a pensar metódica, crítica, reflexivamente. 

De Acordo com Brasil (2007), o conteúdo Ética, não é ensinado diretamente para os alunos como as demais disciplinas como matemática, física, língua portuguesa, biologia entre outras, mas como um conteúdo incluso em cada disciplina e se faz extremamente necessária devido os alunos conviverem com as diversidades inclusas no ambiente escolar, por exemplo, as deficiências intelectual, visual, auditiva e física, preconceitos raciais, econômico e religioso, conflitos de ideias e de gênero. As expectativas é que através de resoluções de conflitos diferenciados e corriqueiros nas escolas auxiliem os alunos criarem autonomia, senso de justiça, solidariedade, e consigam exercerem seus direitos de cidadãos com base nos valores Éticos Morais. (SILVA e AZEREDO, 2013: 138).

Neste cenário, existem já algumas iniciativas, tais como a proposta para construção da ética no ambiente escolar de acordo com BRASIL (2007: 19-20). Trata-se do “Fórum Escolar de Ética e de Cidadania” que com auxilio do Ministério da Educação, debate sobre os temas atuais do cotidiano dos alunos, com a presença de profissionais da escola e a comunidade. (SILVA e AZEREDO, 2013: 139).

As decisões profissionais serão mais consistentes se tomadas com um conhecimento suficiente das leis, das normas, do sistema em que se opera e o com uma reflexão suficiente sobre o próprio papel como profissional docente. Isso leva a modificações e correções no próprio decorrer da prática docente. As diversas carências nessa formação ética inicial amostram em poucos anos seu resultado: condutas antiéticas, distorção do sentido comum. A falta de honestidade básica esperada numa tarefa tão nobre quanto é a do ensino só contribui para a infravalorização da profissão.

Uma escola justa que contribua para uma sociedade justa exige que os seus professores sejam eticamente formados, num duplo sentido: 1) formados no sentido do dever que a sua função, essencialmente ética, implica (deontologia), sendo capazes de o discernir em situações complexas e, por vezes, dilemáticas em que há valores em conflito e se torna difícil determinar qual é o bem do aluno que se deve salvaguardar (por exemplo: informar a família de um comportamento de risco e trair a confiança do aluno que lho confidenciou ou ser leal ao aluno e não trair a sua confiança; seguir instruções de superiores hierárquicos ou do Ministério da Educação ou fazer o que se considera certo); 2) formados para serem promotores do desenvolvimento ético-moral dos alunos, tendo os conhecimentos e as competências para atuarem de acordo com a faixa etária destes (ESTRELA & CAETANO, 2013: 221).

Vale dizer que os profissionais docentes carecem ainda de regras deontológicas: reflexão-ação com o propósito de evitar erros e abrir uma margem de flexibilidade diante do cambio, suficiente para as necessidades que se possam apresentar. Destarte, se dotaria ao futuro professor (e ao aluno) de maior confiança e voz, atualizando e dignificando a profissão, sem necessidade de reescrever e reestruturar cada vez o plano inteiro. 

Neste sentido, podemos redefinir a ética como a “identificação de problemas, dilemas e tensões éticas, entendidos como experiências de conflito, discrepância, questionamento e incerteza, que direcionam as pessoas em direções e sentidos divergentes” (ESTRELA e CAETANO, 2012: 226). É preciso contar com o conhecimento prévio do aluno, ouvir sua opinião, construir sobre o pré-existente, 

Eis um dos pontos essenciais da ética docente: permitir ao aluno expor suas ideias em relação ao assunto tratado, mostrando respeito pelo seu conhecimento prévio e pelas críticas que ele, gradativamente, se habilita a fazer no contato regular com os teóricos – afinal não se busca a Academia pela simples erudição e sim por causa da autonomia de pensamento que se pode alcançar – a fim de se criar um ambiente salutar, para que o discente se conscientize da importância de dar continuidade à construção do seu conhecimento, através da abertura aos conteúdos que o docente pretende lhe apresentar e com ele discutir (FERREIRA, 2006: 208).

Em conclusão, formamo-nos para formar ao tempo que somos éticos para fornecer modelos de conduta para os aprendizes: “quem forma se reforma e re-forma ao forma-se e forma ao ser formado” (FREIRE, 2007: 27).

Conclusões
Nossa breve incursão no tema lança vários desafios: confirma a imperiosa necessidade de tornar presente a Ética Profissional na formação dos atores do processo de ensino/aprendizado, desde as instancias superiores às inferiores, enquanto se concede uma maior divulgação dos avanços.

O professor deve estabelecer uma nova relação com quem está aprendendo; passar do papel de solista ao de acompanhante, tornando-se não mais alguém que transmite conhecimentos, mas aquele que ajuda os seus alunos a encontrar, organizar e gerir o saber, guiando, mas não modelando os espíritos, demonstrando grande firmeza quanto aos valores fundamentais que devem orientar toda a vida (DELORS, 2000).

Dentre as propostas para experiências educacionais sobre ética no currículo, existem cinco tendências: a filosófica percorre a história e os autores que a ela se dedicaram; a cognitivista dá importância ao raciocínio e à reflexão; a afetivista aprecia questões concretas da vida do aluno e pensa nas reações afetivas; a tendência moralista é uma espécie de doutrinação que impõe e evidencia certos valores; por fim, a democrática permite que os membros da comunidade educativa participem equitativamente das discussões e decisões sobre regras e problemas. Nenhum destes métodos por si só consegue convencer mais do que a reflexão e a experiência. Visto que as relações humanas internas dentro da instituição educativa reproduzem as relações sociais e da comunidade, resulta fundamental ancorar a educação moral na vivência social, traçando o estreito elo da coerência entre a palavra e a ação (BRASIL, 2000: 89-95).

Ficam em aberto pesquisas e interesses surgidos após esta breve reflexão, como por exemplo, a necessidade de uma formação integral do professorado de línguas, que abranja seu papel como modelo ético e mediador (“guiando e não modelando”). Convém ainda fazer uma análise dos discursos dos professores para avaliar as crenças e poder desenvolver estratégias para o amadurecimento do olhar que damos ao “outro”. 

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