Ano 5 - Nº 5 - 1/2011

4. Situando a Língua Japonesa no Contexto da História do Ensino de Línguas no Brasil

Em 1908, chegaram ao Porto de Santos, no Kasato-Maru – o primeiro navio de imigrantes japoneses -, 800 imigrantes que foram distribuídos por fazendas de café no estado de São Paulo.”(Línguas Estrangeiras no Brasil - História e histórias Cief/IEL/UNICAMP 2005 - 2010)

Resumo:
O artigo procura situar a história do ensino de língua japonesa no Brasil no contexto histórico do ensino de línguas neste país, partindo dos ideais filosóficos que nortearam o desenvolvimento do ensino de japonês, bem como a evolução do perfil dos seus professores e alunos, das abordagens de ensino e materiais didáticos adotadas por eles; e como estes aspectos influenciaram a situação atual, apontando caminhos para a criação de um novo perfil de docentes.

Palavras-chave: Ensino de japonês como língua estrangeira (JLE), formação de professores e alunos, história de JLE no Brasil.

Abstract: This paper attempts to situate the history of Japanese language education in Brazil in the historical context of language teaching in this country, starting with the philosophical ideals that guided the development of teaching and Japanese as well as the evolution of the profile of their teachers and students, approaches teaching and instructional materials adopted by them, and how these aspects influenced their current situation, pointing out ways to create a new profile of teachers.

Keywords: Japanese as a foreign language, teachers and learners of Japanese education, history of the teaching of Japanese in Brazil

1. Introdução

Sabe-se que o ensino de língua japonesa no Brasil teve início tão logo aconteceu o movimento de imigração dos japoneses para este país em 1908. Há relatos não oficiais de que os planos de manter a educação japonesa entre os imigrantes emergiram nos próprios navios, e esta iniciou-se ali, antes mesmo de desembarcar no Brasil, visto que era necessário manter viva a língua materna para que os japoneses imigrantes não tivessem atraso com relação aos japoneses que lá ficaram, já que a intenção seria retornar em breve ao Japão.

Desta forma, a compreensão do desenvolvimento do ensino de língua japonesa no Brasil só é possível, quando se compreende o processo histórico da imigração japonesa. E ainda, a compreensão da filosofia que o norteou facilita a compreensão do ontem, que, por sua vez, ajuda a compreender o hoje.

O olhar crítico sobre o ontem no âmbito de ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras permite compreender os motivos que nos levaram a ensinar da maneira como ensinamos atualmente e assim refletirmos sobre as nossas práticas contribuindo para um fazer pedagógico mais eficiente.

Por esta razão, o que se pretende aqui é situar o ensino de língua japonesa no contexto histórico do ensino de línguas estrangeiras no Brasil partindo inicialmente da sua filosofia, perpassando sua metodologia, materiais didáticos e o perfil do professor de língua japonesa durante seu processo histórico.

2. Uma análise filosófica

Na análise histórico-filosófica História do Ensino da Língua Japonesa no Brasil (MORIWAKI; NAKATA, 2008) dos ideais que fundamentaram a filosofia de ensino de língua japonesa no Brasil no período inicial da imigração, é possível visualizar o elo entre ideologia e prática. Estes foram baseados no ideal de “formação do japonês”, no espírito de fidelidade ao império e às tradições japonesas, visto que os imigrantes inicialmente desejavam retornar à sua nação providos de maiores riquezas materiais adquiridas no Brasil.

Apesar dessa filosofia de ensino ter perdurado por muito tempo intrínseca no ensino de língua japonesa, aconteceram movimentos contrários a ela, como o “incidente do crisântemo”, no qual parte dos nissei (segunda geração de japoneses, nascidos no Brasil) rebelou-se contra os preceitos de nacionalidade fanática de seus pais, reconhecendo-se brasileiros nativos, genuínos. Tal sentimento provocou revolta recíproca dos japoneses mais tradicionais, que repercutiram em movimentos repressivos, pelas organizações secretas de torturas e massacres aos que se mostrassem contrários ao ideal de patriotismo exacerbado.

No pós guerra surge uma nova maneira de conceituar o ensino de japonês, que já passa a ser ensinada como língua estrangeira com a finalidade de transmissão da cultura japonesa. Todavia, a tendência em não abandonar a cultura espiritual acompanhava veladamente os ideais dos professores de língua Japonesa no Brasil, passando por diferentes estágios e tomando diferentes nuances.

Ainda segundo Moriwaki (2008), esta filosofia fechada de ensino de língua japonesa encontra-se atualmente em extinção. O autor demarca três períodos na história do ensino de Língua Japonesa no Brasil:

  • Parte I - Pré Guerra (1908 – 1941);
  • Parte II - Pós Guerra (1946 – 1979);
  • Parte III – Atualidade (1980 – 1995).

No período inicial, o pensamento do japonês que chegou ao Brasil estava atrelado ao nacionalismo e ao sentimento de lealdade ao império baseado nos ideais confucionistas advindos do período Tokugawa (período em que o Japão esteve sob o domínio dos samurais), desta forma, “despreparado para a sua condição de imigrante em entender outras culturas” (MORIAKI, 2008: 23). Este autor chega a considerar tal postura como uma tendência dos japoneses que vieram para o Brasil em acreditar pertencerem a uma cultura superior.

Os japoneses logo passaram, no segundo período, da condição submissa de trabalhadores nas fazendas à formação de colônias independentes. No início, inclusive havia um interesse maior em manter a educação japonesa prioritariamente, pois esta era considerada mais completa e adequada a seus filhos.

As classes de ensino de língua japonesa normalmente funcionavam nas colônias nos finais de semana, pois as crianças estudavam nas escolas brasileiras durante a semana e, obviamente, eram dadas na língua de origem, pois os pais falavam em japonês com os filhos em casa.

Há também relatos de que existiam escolas colônias, nas quais também eram ensinados outros conteúdos, que não apenas língua japonesa, sendo que algumas famílias preferiam estas escolas, pois oferecia uma quantidade maior de séries (seis anos) e as escolas rurais brasileiras da época (três primeiros anos), além de serem multi seriais.

Apesar de os japoneses submeterem-se a péssimas condições de trabalho, viverem em condições de subnutrição e precariedade, além da quantidade significativa de doenças que eram contraídas, sem condições físicas e psicológicas favoráveis, já surgiam as primeiras escolas em algumas colônias. Surgiam concomitantemente as primeiras associações que visavam manter a amizade entre o Brasil e o Japão e resolver problemas em comum relativos às escolas, às doenças, dentre outros.

A principal função da escola nesse momento era que os filhos dos imigrantes estivessem preparados linguistico e culturalmente para seu breve retorno ao Japão. Os professores destas classes iniciais nem sempre eram professores por formação, mas normalmente poderiam ter outras formações, todavia eram contratados para esta finalidade, pois o mais importante era falar a língua japonesa.

Já em 1919 houve a unificação das associações existentes. Neste período começa a surgir a preocupação em não provocar isolamento dos imigrantes japoneses como aconteceu nos EUA. Essa preocupação acabou por indicar a priorização pelas escolas Brasileiras, para que se tivesse um reforço da amizade entre Brasil e Japão. Assim, os alunos filhos de japoneses passaram a frequentar as escolas brasileiras durante a semana e as escolas de língua japonesa nos finais de semana. Isso acabou por provocar uma mudança no caráter desses alunos, de constituição linguística bilíngue.

Nesse momento o imigrante já não tem mais a intensão de retornar ao Japão e sim em fixar-se definitivamente no Brasil. O governo japonês era aparentemente favorável a isso, pois desejava investir no desenvolvimento interno de seu país, não tendo interesse em provocar uma crise nem tampouco trazer de volta mais bocas para alimentar.

As comunidades japonesas ganharam um caráter cada vez mais organizado que funcionavam como pequenas vilas, “murá”, e suas associações como centros administrativos. As associações eram inclusive responsáveis pelas escolas de japonês nas colônias. A ideia central era o favorecimento da comunidade em detrimento da individualidade.

Aconteceu, então o fenômeno de recriação da cultura, que não poderia evoluir no Brasil da mesma forma que evoluiu com os japoneses que permaneceram no Japão. O ideal era da formação de um japonês fiel ao império e que amasse a pátria.

Permaneciam os ideais de formação do japonês e de fidelidade ao imperador os quais eram seguidos ritualisticamente nas escolas. Esse foi considerado um período áureo, onde foram criadas cada vez mais escolas de língua japonesa, que dobraram de número. Surgem esforços para melhorar a formação dos japoneses, além de investimentos inclusive na profissionalização dos descendentes, que não podiam ser inferiores à dos brasileiros.

Todavia foi também um período marcado pela repressão. Com a segunda guerra, em 1938 decretou-se o fechamento de todas as escolas de língua japonesa. O governo brasileiro na época, estava preocupado com a formação do caráter nacional do seu povo e além disso, o fortalecimento das associações japonesas no Brasil era visto como ameaça, visto que os japoneses eram aliados do grupo inimigo ao grupo aliado ao Brasil.

Na Era Vargas o ponto marcante foi a preocupação com a construção da  identidade do brasileiro e com grupos que pusessem em risco a integridade do Brasil. O choque da repressão teve efeito contrário nos japoneses e o sentimento nacional inflexível de superioridade em relação ao Brasil reforçava-se cada vez mais em determinados grupos.

Com a proibição das escolas japonesas, surgiram escolas clandestinas, ou até mesmo aulas particulares “maquiadas” de prática de esporte, música, etc, onde evidente se ensinava língua também. Isso contribuiu para que cada vez mais os descendentes fossem perdendo o caráter japonês e adquirindo caráter “estrangeiro”, ou seja, genuinamente brasileiro. Todavia, os filhos que não seguiam a tradição de seus pais naturalmente eram deserdados.

Surgiram assim, três grupos de nisseis: os que aceitavam a tradição, os que aceitavam, mas eram abrasileirados e os que se reconheciam brasileiros natos e se  recusavam a aceitar os ideais nacionalistas de ensino de língua japonesa.

Em seguida veio o período de abismo negro, com a derrota do Japão na segunda guerra, onde caiu o mito de invencibilidade do “indestrutível país dos deuses”. Surge o sentimento de descrença por parte de 90% dos japoneses e o consequente desejo de retorno à pátria. Isso provocou um caos nas escolas de língua japonesa.

Surgem vários incidentes e os radicais que não aceitaram a derrota do seu país acabaram por perseguir e dominar as associações. Surgem dois grupos separados que confrontaram entre si. Vários pais foram impedidos de colocarem seus filhos em escolas que fossem contra seus ideais.

Aos poucos, as escolas foram se restabelecendo e tomando um caráter mais voltado para o ensino de língua japonesa como língua de herança. Além disso, proporcionar uma educação superior por um lado, e por outro continuar cultivando o “espírito japonês”.

Surgiram órgãos para congregar todas as colônias e comemorar os 50 anos da imigração. Novas diretrizes foram estabelecidas libertas do espírito japonês. Tem-se ainda nesse período um novo ciclo de imigração trazendo novos ares o que auxiliou os primeiros imigrantes a terem uma melhor compreensão do Japão pós-guerra.

No momento posterior à segunda guerra, ocorreu nova expansão do ensino de japonês no Brasil, já com a perspectiva de Língua de herança. Surgiram novas e mais consolidadas escolas, que consequentemente embasaram a criação de instituições como

a Federação das Escolas de Ensino Japonês no Brasil (Nichigakuren - 1954-1988), a Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa (Burajiru Nihon Bunka Kyôkai - 1955) e a atual Aliança Cultural Brasil-Japão (Nichibunren – 1956). Mais tarde, em 1985, as três entidades se juntarão para formar o atual Centro Brasileiro de Língua japonesa, com sede em São Paulo (MORALES, 2009).

Na Atualidade, permaneceu ainda que velada, a ideologia de uma formação de bons nikkeis (descendentes de japoneses), seguida pela ideologia da formação de bons brasileiros, mas caminhando para a extinção e para o ideal de principal objetivo do intercâmbio cultural e do reforço da amizade entre os dois países.

Surge um novo perfil de imigrantes japoneses e com isso um novo perfil de professores mais especializados e com uma melhor formação. Em 1963 foi criado o primeiro curso de Japonês na Universidade de São Paulo – USP, como bacharelado em estudos orientais, todavia, fazendo parte da faculdade de história.

Em 1987, nas redes públicas de ensino, algumas escolas de ensino fundamental e médio começaram a oferecer o japonês como disciplina extracurricular optativa. Em São Paulo há treze unidades de Centros de Línguas (CEL), e no Paraná onze Centros de Línguas Estrangeiras Modernas (CELEM), conforme dados da Fundação Japão em 2006 (MORALES, 2009). Em 2011, iniciou-se um projeto de implementação do ensino de japonês nas escolas públicas do Distrito Federal, em quatro dos Centros Interescolares de Línguas. Além destas, existem muitas escolas particulares de ensino de língua japonesa distribuídas em todo o país.

O ensino de japonês que até então era tido como língua de herança, começa efetivamente a partir de meados de 1980 a ser ensinado como língua estrangeira (MORALES, 2009). Este é o período onde investe-se mais na formação do professor de Japonês, ao que antes bastava unicamente falar a língua.

2. A língua japonesa no contexto histórico do ensino de línguas estrangeiras no Brasil

É a partir do momento histórico brasileiro de passagem do movimento estruturalista/audiolinguista ao comunicativista, que procuraremos analisar a metodologia de ensino de língua japonesa no Brasil, bem como mostrar como ficou situada dentro da linha histórica do ensino de línguas estrangeiras no Brasil.

O método audiolingualista baseia-se em estruturas gramaticais prontas apresentadas com frases soltas e repetições com o objetivo da correção até que o aluno produza frases perfeitas, como descrito no trecho a seguir:

O método áudio-lingual, assim como o método direto, tem como característica distintiva a utilização da língua-alvo para o ensino no cotidiano das aulas. Entretanto, o primeiro pressupõe que a aprendizagem da língua depende da formação de hábitos, por isso o uso extensivo de drills (exercícios repetitivos) para treinar as estruturas gramaticais corretas da língua. Acredita-se que quanto mais acontece a repetição das estruturas corretas da língua mais rapidamente se dá sua memorização e aprendizagem da língua-alvo (LARSEN-FREEMAN, 2000: 45). (SATELES & ALMEIDA FILHO, 2010)

Vale lembrar que os métodos baseados em estruturas prontas, ou métodos estruturais, são nada menos que abordagens gramaticais. No comunicativismo, ou Abordagem Comunicativa, o foco e o planejamento de ações do professor parte das necessidades, desejos, interesses e realidade dos alunos,  quando daí se estabelecem os conteúdos, para que possam receber significado e assim se tornar relevantes ao desempenho interativo dos alunos. Nele se permite o desenvolvimento de projetos, além do desenvolvimento de temas transdisciplinares, valendo-se ainda do uso extensivo da língua mesmo que, partindo de exercícios mecânicos de substituição, adotados nos métodos gramaticais (ALMEIDA FILHO, 2009).

Comparando as duas abordagens, é possível delinear as lacunas da gramatical, uma vez que em situações comunicacionais as quais não forem contempladas pelas estruturas contidas no método, o aluno não será capaz de comunicar-se. Em outras palavras, o aprendiz do método gramatical conhece a gramática, mas não se comunica de forma ampla como no comunicativismo.

Na abordagem comunicativa, ao contrário, o aluno comunica-se com domínio e aprende as estruturas gramaticais dentro e a partir de um contexto muito mais amplo. Mas o foco é na oralidade e na competência comunicativa.

Temos ainda, traços da metodologia de ensino baseada em atividades de leitura e tradução, vestígio da abordagem gramatical. A exemplo disso temos o material Nippongo Nº 1, 2 e 3 (Figura 1), os primeiros livros didáticos elaborados no Brasil em 1960 (Arquivo pessoal: Professora Masayo Ueno).


Figura 1: Nippongo nº 1, 2 e 3.

Moraiwaki e Nakata (2008) apresentam uma pesquisa com importantes considerações sobre o ensino de língua japonesa no Brasil, todavia, falta  detalhamento e aprofundamento no que tange às abordagens e métodos adotados no ensino de Japonês.

3. Analisando Materiais Didáticos

Através da análise dos livros didáticos de língua japonesa mais utilizados no Brasil historicamente, é possível traçar um perfil metodológico adotado pelos professores. Neste sentido Mukai e Yoshikawa (2009) realizam uma análise crítica de dois livros didáticos de ensino de língua japonesa: O Nihongo Shoho (Fundação Japão, 1981) e Minna no Nihongo (3A Corporation, 1998).

A pesquisa foi realizada com o intuito de evidenciar as diferenças entre os dois materiais, ressaltando a importância do seu uso não como única ferramenta para o ensino da língua, mas como ponto de partida para uma aprendizagem mais satisfatória.

Também se coloca claramente como um dos objetivos do artigo, o posicionamento contrário à adoção do livro didático como fundamento para a abordagem adotada pelo professor em sala de aula, ao contrário, partindo de seus objetivos pré-definidos, que o professor possa fazer uso do livro didático como ferramenta complementar ao seu trabalho, além de outros recursos didáticos.

A pesquisa foi justificada pelo fato de o primeiro livro ser utilizado na Universidade de Brasília desde 1981, e o segundo por ser um dos livros mais adotados no ensino de Japonês no Brasil. O primeiro livro analisado,  Nihongo Shoho, tem caráter audiolingual, de syllabus tipicamente estrutural e o segundo, Minna no Nihongo, apesar de descrito pelos autores do artigo como comunicativo e de ênfase à oralidade, é baseado em estruturas padrão e diálogos situacionais, portanto, mais se aproxima do que Almeida Filho (2009) define como um método gramatical “comunicativisado”.

O Livro Nihongo Shoho é composto de diálogos, os quais os autores consideram não-suficientes para situações reais ou autênticas, pois não levam em consideração o contexto sociocultural dos estudantes. Sobre o segundo livro, o Minna no Nihongo, os autores consideram que apesar de ser um material rico e com bastante recursos adicionais, não está adequado à realidade dos estudantes de escolas públicas brasileiras (onde é amplamente utilizado), pois está voltado, por exemplo, a um público que tem interesse em viajar ao Japão a serviço, no que diz respeito a vocabulário.

A análise do artigo de Yuki e Mayumi (2009) aponta a carência de livros didáticos de língua japonesa adequados à realidade dos estudantes brasileiros, que tenham um caráter adequado às suas necessidades e interesse pela língua, em consonância com a abordagem comunicativa de ensino de línguas, tão amplamente aceita e discutida atualmente.

É fato que estes dois (Nihongo Shoho e Minna no Nihongo) não são os únicos materiais disponíveis para o ensino de Japonês no Brasil, outros dois de grande veiculação nacional são o Puroguresshibu, I a VI da Aliança Cultural Brasil-Japão, de base também audiolingual; e os livros da metodologia Ezoe Bumpou, que adota o método direto. Ambos são estruturalistas, de base gramatical. Esse fator predominante nos livros didáticos de Japonês, provavelmente ocasionou um ensino de certa forma ainda enraizado nos preceitos do método gramatical.

Isso pode ter contribuído para se atingir um número significante de evasão dos estudantes de língua japonesa apontados também na pesquisa da professora Nakata, o que reforça a necessidade de repensar as estratégias de ensino dos professores de língua japonesa no Brasil e ainda a valorização de pesquisas que venham a repensar inclusive os materiais didáticos de ensino de língua japonesa sem desconsiderar a abordagem de ensino mais eficiente ao perfil do estudante da língua nos dias atuais.

4. Perfil do aluno e perfil do professor – Considerações finais

Deve-se levar em consideração que o perfil dos estudantes de língua japonesa na atualidade é completamente diferente dos tempos iniciais. Hoje o interesse pela língua japonesa não está restrito apenas aos descendentes. Voltando mais uma vez à história do ensino de língua japonesa no Brasil nota-se que a maior motivação para o estudo da língua é o interesse cultural, representando 20%, superando o de ser nikkei, que é de 9%. (MORIWAKI; NAKATA, 2008:183).

Isso se reafirma, em levantamento feito para este artigo na Universidade de Brasília, com alunos do curso de licenciatura em Língua e Literatura Japonesa, no qual os alunos em sua maioria responderam ter escolhido estudar a língua por terem principalmente interesse cultural.

Nakata (2008) constata que 94% dos alunos atualmente são brasileiros, mas não chega a evidenciar o percentual de estudantes descendentes de japoneses, fato que interessa-nos saber, pois inicialmente a língua era ensinada exclusivamente aos japoneses e seus descendentes.

Segundo Suzuki (2011), também professora da Universidade de Brasília, em entrevista concedida a esta autora, o percentual de seus alunos descendentes é de apenas 22%, de acordo com os registros das turmas em que atuou desde 2009.

Diante desses registros, é possível delinear um novo perfil para professores de Japonês exigido atualmente. Destaco então, a seguinte questão de Nakata (2008:187) em sua pesquisa: “Não seria o caso de pensarmos numa revisão completa do conteúdo programático e dos métodos didáticos?”.

O analisado até aqui possibilita reafirmar a questão acima e apontar outras: o ensino de língua japonesa no Brasil acompanhou os movimentos comunicativistas amplamente discutidos no âmbito da Línguistica Aplicada atual? Permaneceram baseados em abordagens estruturais no ensino de línguas atrelados à abordagem adotada anteriormente no primeiro período da imigração pelos motivos filosóficos discutidos até aqui?

O estudo realizado neste artigo aponta a necessidade de promover uma formação de professores voltada a preencher as lacunas causadas pela abordagem gramatical a qual foram submetidos enquanto estudantes de língua japonesa. Assim como de reformular o perfil do professor, com fundamentação no âmbito da Línguística Aplicada, para que ele possa contribuir com a construção de novas concepções de ensino-aprendizagem partindo da percepção da sala de aula de línguas estrangeiras como um ambiente científico rico.

Tais ações não devem se restringir aos professores de língua japonesa, outrossim devem alcaçar àqueles envolvidos com qualquer língua estrangeira, para que se alcance um processo efetivo de ensino-aprendizagem que venha a formar falantes competentes na língua-alvo.

Referências

  • ALMEIDA FILHO, José Carlos Paes de. Linguística Aplicada – Ensino de Línguas & Comunicação. Campinas, SP. Pontes Editores Arte e Línguas 3ª edição, 2009.
  • ______. Dimensões comunicativas no ensino de línguas. Campinas, SP. Pontes Editores, 5ª edição, 2008.
  • ______. Ontem e hoje no ensino de línguas no Brasil. In: STEVENS, C.M.T. e CUNHA, M.J.C. Caminhos e colheita: ensino e pesquisa na área de inglês no Brasil. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2003.
  • CHAGAS, Valnir. Didática Especial de Línguas Modernas. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1979.
  • MORIWAKI, Reishi; NAKATA, Michiyo. História do Ensino da Língua Japonesa no Brasil. Campinas, SP. Editora Unicamp, 2008
  • MORALES, Leiko Matsubara. Breve história do ensino de língua japonesa no Brasil, 9 jun 2009. Disponível em:
  • <http://www.discovernikkei.org/en/journal/2009/6/9/lingua-japonesa-no-brasil/>. Acesso em: 20 out. 2011.
  • SATELES, Letícia Maria Damaceno; ALMEIDA FILHO, José Carlos Paes de. Breve Histórico da Aborgagem Gramatical e seus Matizes no Ensino de Línguas no Brasil. Revista HELB, ano 4 nº 4 - 1, 2010. Disponível em: http://www.helb.org.br. Acesso em: 10 nov. 2011.
  •  MUKAI, Yuki; YOSHIKAWA, Mayumi Edna Iko. Análise e Crítica de Dois Materiais Didáticos em Lingua Japonesa. Estudos Japoneses, USP, nº29, 2009. ISSN 1413-8298.
  • SUZUKI, Tae. Levantamento de dados sobre aprendizagem e ensino de japonês. Universidade de Brasília, Brasília, 2011. Entrevista concedia a Geanne Alves de Abreu Morato.