Ano 5 - Nº 5 - 1/2011

8. A Importância do Artigo de Edward M. Anthony (1963) e da sua Tradução Hoje

Resumo
Neste artigo são trazidas justificativas históricas e epistemológicas para uma revisitação dessa obra mediada agora pela tradução (apresentada neste volume) ao Português desse artigo seminal de Anthony passados 50 longos anos da sua publicação original na Revista Foreign Language Teaching em abril de 1963. 

Palavras-chave: abordagem, método, técnica

Abstract

In this article some historical and epistemological justification for revisiting the famous text by Edward Anthony mediated now by a translation (published in this volume) of such seminal article  into Portuguese after 50 long years have elapsed since its original publication in the Foreign Language Journal in April 1963.

Keywords: approach, method, technique     

O artigo seminal “Abordagem, Método e Técnica” de Edward M. Anthony[1] completa em 2013 a marca histórica de 50 anos. Temos o que comemorar nesse aniversário. Esse artigo típico da trepidante década de 60 do século 20 representa na atualidade um monumento respeitável à hoje indispensável distinção entre esses três termos técnicos representativos de uma escala hierárquica de níveis de generalização e de trabalho distintos: o de abordagem, o de método e o de técnicas. Há um problema conceitual ou talvez de mera ilustração quanto ao que seriam as técnicas ou procedimentos nesse texto do autor. Ocorre ao final do artigo a inclusão do que seriam hoje recursos (laboratório, fonógrafo, lousa etc) no lugar de técnicas. Isso em nada desmerece a adiantada visão anthoniana de que precisávamos reconhecer com explicitude categorias, generalizações e relações hierárquicas no grande processo de ensino de línguas que chamei de operação global de ensino de línguas (Almeida Filho, 1993).  Numa época em que não havia uma definição bem delimitada para cada termo, era fácil cair em equívoco e usá-los como sinônimos, alimentando assim a imprecisão conceitual no tratamento teórico da área de AELin (Aquisição/Aprendizagem e Ensino de Línguas).  A facilidade do equívoco ainda não está completamente afastada mesmo nesta segunda década depois do ano 2000.

Assim, o objetivo de Anthony foi o de tentar “esclarecer a confusão terminológica entre os três termos” (Almeida Filho, 1997:19) e isso ele o fez com galhardia.  A partir daí, o autor propôs o que foi chamado de “hierarquia clássica” de abordagem, método e técnica, na qual a abordagem estaria no topo da cadeia, como o ponto mais forte, abrangente e abstrato, seguida pelo método (até então o termo mais poderoso e popular) e finalmente, pela técnica ou procedimentos de ensino. Tal modelo hierárquico (vide a hierarquia de Anthony no Glossário de Linguística Aplicada) foi modificado por Richards & Rodgers, em 1982, tentaram reverter a proposta do linguista aplicado de Pittsburgh quase vinte anos depois.  Esses autores de grande popularidade  também usaram essa mesma tríade com a inversão de posição reconduzindo o termo método ao topo.  Esses autores, no entanto, reduziram o modelo a apenas dois níveis – o do método, acima de tudo, e o de abordagem logo abaixo. Quase ninguém aderiu a esse esquema como definitivo ou superior ao original de Anthony. Nessa concepção, o termo método e não abordagem é que ocupa a posição orientadora das ações concretas do ensino. Essa modificação restauradora da posição do método na cúpula não prevaleceu e a proposta pioneira de Anthony tem sido majoritariamente mantida na profissão e na seara científica da pesquisa aplicada.

No modelo de Anthony não há menção das quatro materialidades da operação de ensino explicitadas por Almeida Filho (1993) no nível do método, a saber, o planejamento de cursos e de curriculo, da criação ou da adoção do material didático, da produção das experiências na nova língua (o método propriamente dito) e a da avaliação do processo.  Richards & Rodgers (op cit) reconhecem de modo rápido, pouco desenvolvido, somente as fases dos procedimentos (método) e do planejamento. A novidade no caso desses autores é a inserção implausível da abordagem entre as fases ou materialidades do ensino confundindo o plano das ideias com o das concretudes do ensino e da aprendizagem.

Mais abaixo das técnicas ou dos procedimentos no modelo de Anthony não há mais nada. Em nossa época, contudo, atrelados a todas as ações e especialmente à produção das experiências com e na nova língua nas aulas, ficam ainda previstos os recursos vários que viabilizam, intensificam ou realçam as ações, os procedimentos ou técnicas.No modelo anthoniano, os recursos tecnológicos como o gravador e o laboratório de línguas foram confundidos com o componente procedimental. Por estar a pelo menos uma década do surgimento do movimento comunicativo apoiado na idéia de uma nova abordagem que não a gramatical, Anthony aplica o conceito correto de abordagem a manifestações ou tendências da abordagem gramatical (sem nomeá-la como tal, contudo) como a audiolingual ou audio-oral, conforme a distingue. O conceito de abordagem comunicativa não estava absolutamente disponível ainda em 1963 e para o de abordagem gramatical amplamente praticado não havia consciência por ser único e avassalador. Ensinar pela abordagem gramatical não permitia consciência também pelo fato de ela parecer a maneira única e natural de ensinar línguas.

Para se entender a importância dessa obra de Anthony, um mero artigo de revista científica e não um livro autoral para o ensino de línguas, faz-se necessário dizer que o presente artigo tem sido continuamente citado por estudiosos da teoria de ensino e aprendizagem das línguas e por lingüistas aplicados renomados como, por exemplo, Richards & Rodgers, em seu artigo também famoso “The nature of approaches and methods in language teaching” (1982), Allwright em “A Morte do Método” (1991), Prabhu em seu impactante artigo “Não há o melhor método – Por quê?” (1990), Almeida Filho em seu livro “Parâmetros Atuais para o ensino de Português Língua Estrangeira” (1997), Brown, em seu artigo “English Language Teaching in the Post-Method Era: Toward Better Diagnosis, Treatment and Assessment” (2007), entre inúmeros outros.

Pelo exposto, deduzimos que a presente tradução para a língua portuguesa, ainda que tardia, será de grande valia para professores e pesquisadores da área de AELin, professores de PLE e de outras línguas e para aqueles que ainda não tiveram a oportunidade de tomar conhecimento do referido artigo e da sua importância como obra pioneira de referência para o desenvolvimento e re-organização da teoria do ensino de línguas a partir dos estudos de abordagem. O interesse histórico do texto só adensará o apetite dos leitores por teoria relevante aos processos de adquirir e ensinar línguas que essa magnífica contribuição de Edward Anthony nos trouxe há cinquenta anos.  

Referências Bibliográficas:

  • ALLWRIGHT, D. A morte do método.  Tradução de Silma Carneiro POMPEU . In  Revista Horizontes, PPGLA/UnB, ano 2, no. 2 (p. 21-29), dez 2003.   Do original The Death of the Method. Plenary paper for the SGAV Conference, Carleton University, Ottawa, Canada, 1991.
  • ALMEIDA FILHO, J.C.P.  Dimensões comunicativas no ensino de línguas. Capinas: Pontes Editores, 1993.
  • _________  Parâmetros Atuais para o ensino de Português Língua Estrangeira. Campinas: Pontes Editores, 1997.
  • ANTHONY, E.M. Approach, Method and Technique. English Language Teaching, vol.17, 1963.
  • BROWN, H.D. English Language Teaching in the “Post-Method” Era: Toward Better Diagnosis, Treatment, and Assessment. Cambridge University Press, 2002.
  • PRABHU, N.P. There is no Best Method – Why?, TESOL Quarterly, vol. 24/2, 1990.
  • RICHARDS, J.C. & Rodgers, T.S. Method: Approach, Design and Procedures. TESOL Quarterly, vol. 16/2, 1982.

[1]              Originalmente publicado na revista English Language Teaching (ELT), vol. 17 (p. 63-67), 1963.