Ano 6 - Nº 6 - 1/2012

4. Colégio Pedro II: Um Lugar de Memória do Ensino de Línguas no Brasil

Resumo
Entendendo como ponto de partida que o “lugar de memória” não é uma “cristalização do passado”, mas o afloramento de memórias vivas, múltiplas e coletivas. Pretendemos justificar nesse trabalho o Colégio Pedro II como lugar de memória do ensino de línguas no Brasil já que o mesmo era considerado instituição modelo sendo, talvez, o único a implementar todas as reformas educacionais que aconteceram no Brasil desde o Império. Dessa forma, a partir dessa revisita esperamos desenhar ainda que sucintamente os caminhos percorridos pelo ensino de línguas no Brasil a fim de entender os processos atuais, para tanto baseamos nossa discussão teórica, principalmente, em Chagas (1957), Teixeira (1989), Almeida Filho (2003), Nora (1993).

Palavras-chave: Ensino de Línguas. Colégio Pedro II. Lugar de Memória

ABSTRACT

Considering that a “heritage site” is not a “crystallizationof the past”,but the emergence of lively, multiple and group memories, we intend to rationalize Colégio Pedro II (Pedro II School) as a heritage site regarding language teaching in Brazil, since it was considered a model school, and maybe the only one to implement all the educational regulations ruled in the country since the Empire. Thus, from this review we expect to outline, even if concisely, the path of language teaching in Brazil aiming to understand the current processes. In order to do so we based our theoretical discussion mainly in authors as Chagas(1957),Teixeira(1989),AlmeidaFilho(2003) andNora(1993).

Keywords:Language teaching, ColégioPedroII (Pedro II School), heritage site

Introdução

Vivemos para o estudo
Soldados da ciência
O livro é nosso escudo
E arma a inteligência.
Hamilton Elia
(Hino do Colégio PedroII)

A História tem se construído como disciplina responsável pelo resgate histórico, ou seja, por nos lembrar de quem somos. É com este intuito que ela tem proposto a releitura do passado a fim de responder às lacunas ainda existentes e oferecer outros olhares a partir do ponto de vista dos excluídos, da mulher, do soldado de guerra etc (PINSKY, 2005).

Entretanto, como trilhar os caminhos borrados pela ação do tempo em busca destas lacunas? Para solucionar esta questão é necessário encontrar pistas históricas que recontem estes acontecimentos e, para tanto, os patrimônios históricos, as fotos de família, festas, documentos, textos literários, manuais didáticos vem sendo considerados como fontes históricas.

Essa possibilidade permite uma aproximação ao que definimos como “lugar de memória” de acordo com a conceituação de Nora (1993), pois esses documentos permitem evocar a História de um tempo e espaço. Aproximando esta discussão da nossa área de estudos: AELin (Aquisição Ensino e Aprendizagem de Línguas) e formação de professores, nos perguntamos como a História pode servir de pano de fundo para refletir a respeito do futuro do ensino de línguas já que podemos revisitar, por exemplo, anotações de professores, boletins, narrativas orais de alunos, porteiros a fim de desenhar os caminhos percorridos pelo ensino de línguas no Brasil.

Na tentativa de responder a estas e outras questões, temos como objetivo justificar o Colégio Pedro II como lugar de memória do ensino de línguas no Brasil a partir de uma discussão teórica baseada, principalmente, em Chagas (1957), Teixeira (1989), Almeida Filho (2003) e Nora (1993). Para tanto, apresentaremos inicialmente um conceito breve de lugar de memória, posteriormente a situação do ensino de línguas no Brasil Colônia e nos estendemos até o ano de 1931 (Reforma Francisco de Campos), quando se manifesta mais claramente o papel desta instituição de ensino para a história do ensino de línguas no Brasil.

1. Lugar de Memória

Pierre Nora, em 1984, inicia seu texto “Entre Memória e História: a problemática dos lugares” com a seguinte constatação:

Aceleração da história. Para além da metáfora, é preciso ter noção de que a expressão significa uma oscilação cada vez mais rápida de um passado definitivamente morto, a percepção global de qualquer coisa como desaparecida – uma ruptura de equilíbrio. O arrancar do que ainda sobrou de vivido no calor da tradição, no mutismo do costume, na repetição do ancestral, sob o impulso de um sentimento histórico profundo. A ascensão à consciência de si mesmo sob o signo do terminado, o fim de alguma coisa desde sempre começada. Fala-se tanto de memória porque ela não existe mais. (NORA, 1993, p.07)

Com estas palavras, Nora nos alerta como a velocidade é devastadora, nos deixando somente vestígios e por isso vemos a necessidade de arquivar, de fazer registros. Com isso, o lugar de memória vem a ser uma linha tênue entre a história e a memória apesar de uma distinção evidente para o autor.

Memória, e história: longe de serem sinônimos, tomamos consciência que tudo opõe uma à outra. A memória é viva, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido, ela está em permanente evolução aberta à dialética da lembrança e do esquecimento inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e manipulações, susceptível de longas latências e de repetitivas revitalizações. A história é a reconstrução sempre problemática e incompleta do que não existe mais. (...) A memória emerge de um grupo que ela une, o que quer dizer, como Halbwachs o fez, que há tantas memórias quantos grupos existe; que ela é, por natureza, múltipla e desacelerada, coletiva, plural e individualizada. A história , ao contrário, pertence a todos e a ninguém, o que lhe dá uma vocação para o universal. A memória se enraíza no concreto, no espaço, no gesto, na imagem, no objeto. (NORA, op. cit)

Com a atual crítica com relação ao documento escrito como fonte única de estudo para a História, os documentos expandem suas fronteiras e abrangem a palavra, o gesto (LE GOFF, 2003), e também objetos diversos, como diários, cartas; instrumentos como livros, manuais; instituições, como museus e colégios. Esta visão nos permite entender o lugar de memória não somente como uma “cristalização física do passado”, mas dependente “apenas da realidade que os habita: uma realidade de que os mesmos são, então, depositários, enquanto condensações simultâneas do trabalho da História (sedimentações) e afloramentos da perpetuação da Memória (reminiscências)” (ABREU, 2005).

Nora, então, esclarece que o lugar de memória em si deve reter como características o material, o simbólico e o funcional, mesmo que em graus diferentes o que lhe permite ponderar que nem todo documento pode ser considerado lugar de memória. Assim define lugar de memória como sendo

lugares com efeito nos três sentidos da palavra, material, simbólico e funcional, simultaneamente somente em graus diversos. Mesmo um lugar de aparência puramente material, como um depósito de arquivos, só é lugar de memória se a imaginação o investe de uma aura simbólica. Mesmo um lugar puramente funcional como um manual de aula, um testamento, uma associação de antigos combatentes só entra na categoria se for objeto de um ritual. Mesmo um minuto de silencio, que parece um exemplo extremo de uma significação simbólico, é ao mesmo tempo o recorte material de uma unidade temporal e serve, periodicamente, para uma chamada concentrada de mudança.” (Nora, op. cit)

Diante dessa compreensão, passamos a entender o Colégio Pedro II como uma instituição de ensino que revestida de simbologia nos permite resgatar questões referentes ao ensino de línguas no Brasil, o que possibilita um entendimento histórico deste tema na atualidade. Dito isso, sintetizamos o cenário do ensino de línguas no Brasil nos primeiros 300 anos, a fim de destacar as principais mudanças sinalizadas no colégio, a seguir.

2. O Ensino de Línguas no Brasil nos primeiros 300 anos

O Brasil nos seus primeiros 300 anos era uma sociedade com homens de baixo letramento, com forte presença da Igreja Católica representada pelos jesuítas, indígenas, escravos e poucas mulheres inicialmente. A economia, baseada na exploração, impedia a realização de transações comercias que estavam restritas à colônia devido à prática mercantilista adotada pela metrópole. Esta visão restrita à exploração da terra impossibilitou a instalação de fábricas, da imprensa, da tipografia e de universidades o que impediu o surgimento de outras práticas sociais culturais que existiam na metrópole como cafés, bibliotecas, teatros, etc.

[a Colônia] vive uma experiência social única, marcada pela extinção da população aborígine, pela escravidão negra, pelo latifúndio e mercantilismo agrário, e por uma burocracia governamental particularmente dura e sem imaginação, mas superiormente organizada e servida por extraordinária estrutura de treino e educação, ou endoutrinação, proposta a uma transplantação cultural vigorosa e planejada (TEIXEIRA, 1989, p.56).

A Educação, portanto, como anuncia Teixeira tinha como principal objetivo estabelecer uma ordem e propagar uma cultura clássica. Os Colégios dos Jesuítas foram responsáveis, nestes primeiros séculos, pela educação na Colônia. Neste período, poucos eram os homens que tinham acesso às letras, restrito ao próprio clero e a uma pequena burguesia. Assim, possuíamos

uma educação formal de língua latina e dos métodos exegese e disputação do fim da Idade Média, métodos que representavam os períodos decadentes da cultura medieval e habitavam o “intelectual” gozo dos privilégios atribuídos ao clero e ao funcionário da Colônia, dentro das estritas necessidades do serviço de defesa da imobilidade da Igreja e do Estado, tal como se achavam organizados (Teixeira, op. cit, p. 59)

Dessa forma, estava proposta uma educação baseada no método Ratio Studiorum que enfocava disciplinas como Retórica, Humanidades e Gramática no qual o latim e o grego eram as línguas dominantes. Observamos na afirmação de Chagas (1957, p.104) a descrição desse período, quando o autor declara que na escola de segundo grau predominou “o humanismo clássico Ratio Studiorum, consubstanciado num curso que abrangia as 'cinco classes' de estudos representadas pela Retórica, pelas Humanidades e pelas Gramáticas Superior, Média e Inferior.” Este é um breve retrato da educação no Brasil, retrógrado, em linhas gerais. É neste cenário que situamos o ensino de línguas em terras brasileiras. 

Neste momento, no Brasil Colônia, encontramos três línguas: a língua geral (tupi), a língua portuguesa e o latim. As duas primeiras mantinham uma relação bastante próxima já que os Jesuítas as usavam para a catequese. A terceira possuía um espaço mais restrito aos seminários e liturgias.

A Educação era ministrada em latim, latim da Igreja e da ordem eclesiástica do Estado, não podendo dela, decorrer nenhum interesse pelo estudo de problemas novos que a situação real da Colônia pudesse suscitar (TEIXEIRA, op. cit, p.58)

Ainda com relação à língua geral e ao português percebemos um caráter de aquisição bastante latente. A principio a necessidade de comunicação foi a motivação primeira para suas respectivas aprendizagens. Ou seja, os jesuítas precisavam aprender a língua indígena para impulsionar os projetos de evangelização e o português era aprendido como língua universal para fins de trabalho, já que conviviam várias línguas no mesmo espaço. E, ainda se “constitui como língua ensinada aos índios para assimilá-los à Igreja e ao Cristianismo”. (ALMEIDA FILHO, 2003, p. 22)

Então, podemos elaborar dois quadros. No primeiro, destacamos o ensino do latim baseado em um modelo de ensino tradicionalista, mecânico e repetitivo que valoriza a expressão escrita, culta e padrão que acontecia nos seminários e escolas jesuítas. E, no segundo quadro, o ensino do português e do tupi baseado na necessidade de comunicação, no contato direto entre nativos em contextos reais de prática social no qual a expressão oral é mais relevante.

No decorrer deste processo histórico, a reforma proposta pelo Marquês de Pombal será determinante, em parte, para algumas mudanças no sistema de ensino vivenciado na Colônia e das línguas ensinadas até o momento. O decreto do Alvará de 28 de junho 1759 desvincula a responsabilidade do ensino da Igreja e a passa para o Estado, que será o responsável pela formação intelectual da nação. Mesmo com a expulsão dos jesuítas, a partir do decreto supracitado, a educação no Brasil segue modelos arcaicos baseados no modelo jesuíta sem professores com formação adequada para dar seguimento ao projeto de desenvolvimento pretendido pelo Marquês.

Entre as propostas defendidas na Reforma Pombalina destacamos a inserção do ensino de línguas vivas como o francês, o italiano e o inglês, com a finalidade de estreitar as relações comerciais, e o ensino obrigatório da língua portuguesa.

A partir de 1808, uma nova fase tem início no Brasil: o Império. A chegada da Família Real promove muitos avanços em termos sociais, culturais, econômicos, assim a Colônia ganha novos rumos.

 

3. Pedro II: lugar de memória do ensino de línguas no Brasil

A evolução do ensino de línguas no Brasil confunde-se com a história da própria escola secundária brasileira. Uma está contida na outra, tal como a parte se integra necessariamente no todo. (CHAGAS, 1957, p. 83)

A epígrafe vem reforçar a intrínseca relação que se estabelece entre o ensino de línguas no Brasil e as escolas. As instituições de ensino de alguma forma, no nosso entender, são espaços que retém a memória. Elas guardam vestígios em sua documentação, em seus corredores e em suas salas de aula dos pensamentos e modelos relacionados ao ensino que nos permitem, no presente, evocar esta memória a fim de melhor compreender o modo de pensar e agir de uma época observando assim suas consequências para a atualidade. A partir disso, a seguir, apresentaremos algumas informações a respeito do Colégio Pedro II visando justificá-lo como lugar de memória do ensino de línguas no Brasil.

3.1. Colégio Pedro II e o ensino de línguas

 

O Colégio Pedro II – figura 01 – localizado no centro do Rio de Janeiro, hoje considerado Patrimônio Histórico, guarda significativa história desde sua fundação em 1837 até a atualidade. Isto é perceptível no interesse histórico que o colégio desperta manifestado como objeto de pesquisa de muitos estudiosos da educação .


Figura 01: Colégio Pedro II

Sendo, portanto, símbolo dos novos rumos da educação no Brasil. O Colégio Pedro II, cujo nome homenageia ao Imperador-menino, criado por decreto em 1837, inaugura uma educação “modelo e padrão” (Teixeira, p.73) com o objetivo de “reunir as aulas régias ou avulsas que se encontravam dispersas em um mesmo local (...)”. (MOISES, 2007)

A proposta da elite era criar uma única instituição que servisse de modelo aos demais estabelecimentos que ministravam esse ramo de ensino, tanto públicos como particulares, não só do Município da Corte, mas, também, em outras províncias. O objetivo central visualizado nos Planos de Estudos elaborados por Vasconcelos era a condução dos jovens ao ingresso nos cursos superiores e elevar os estudos de Humanidades no Brasil. (MOISES, 2007)


Figura 02: Decreto

É exatamente a partir deste período que se nota um posicionamento mais definido com relação ao ensino de línguas no Brasil, no qual o currículo dispunha o estudo obrigatório de línguas vivas como o francês e o alemão, mesmo com algumas limitações. Este cenário é confirmado por Chagas (op. cit) e Teixeira (op. cit).

As línguas modernas ocuparam então, e pela primeira vez, uma posição análoga à dos idiomas clássicos, se bem que ainda fosse muito clara a preferência que se votava ao latim. Entre aquelas figuram o francês, o inglês e o alemão, de estudo obrigatório, assim como o italiano, facultativo. (Chagas, 1957, p.105)

(...) o Colégio Imperial Pedro II, o qual, com os seus similares nas províncias, passam juntamente com estabelecimentos privados a nos dar a educação secundária, com um currículo de tipo clássico-científico, lembrando longinquamente o liceu francês. Seria por extensão da palavra, um curso humanístico, por oferecer estudos do latim e grego. A rigor, porém, o latim e o grego eram, como o francês e o inglês ensino elementar de línguas, sem envolver as respectivas literaturas. (TEIXEIRA, 1989, p.72)

O próprio regimento interno do Colégio Pedro II especificava como objeto de ensino da instituição o estudo das línguas modernas a partir da 6ª série.

No Capítulo XIX, designado Do objeto de ensino, define-se o planejamento de ensino do Colégio Pedro II, centrado no domínio das línguas, organizado de maneira progressiva e distribuído em seis tabelas seqüenciais. Como já mencionado na exposição do Decreto de criação do Colégio Pedro II, nestas tabelas, havia o predomínio das letras clássicas, tendo ainda sido privilegiados os estudos das matemáticas, das línguas modernas, das ciências naturais e físicas e a história. Sua distribuição ocorria da seguinte maneira: nas duas primeiras séries (7.ª e 8.ª), eram ministradas a Gramática Nacional, a Gramática Latina, a Aritmética, a Geografia, o Desenho e a Música Vocal; na 6.ª, 5.ª, 4.ª e na 3.ª séries havia uma maior incidência do Grego e Latim (Humanidades Clássicas). A partir da 6.ª série, somavam-se aos estudos clássicos as línguas modernas, as ciências naturais e físicas. Ao atingir a 2.ª e a 1.ª séries, o predomínio recaía sobre a Filosofia e a Retórica. Nestas séries, prosseguiam os estudos das Ciências Físicas. As Matemáticas estavam presentes em todas as séries do curso; já os estudos históricos eram ministrados na 6.ª série e teriam continuidade até o final do curso (REGULAMENTO apud MOISES, 1838, p. 119) (grifo nosso).

Observa-se que o Colégio Pedro II representa a evolução do ensino de línguas no Brasil. As principais propostas do Estado no que diz respeito à formulação curricular, a inserção de disciplinas e aos métodos de ensino foram prontamente postas em prática. E, isso não foi diferente com a Reforma Francisco de Campos.

Em 1930, uma nova reforma da educação brasileira é proposta com a intenção de formar integralmente o adolescente. Entre as medidas adotadas, enfatizamos o papel que o ensino de línguas passa a exercer no plano de ação da Reforma Capanema. Era a primeira vez que o ensino de línguas vivas tinha uma importância maior com relação ao ensino do latim, o que nos permite considerá-lo um tempo áureo do ensino de línguas modernas. Também, é o primeiro momento em que ficava expressa em Lei a adoção de um método de ensino específico a ser seguido pelos professores, o método direto.

As “línguas vivas estrangeiras” tiveram, porém, uma visível predominância sobre o latim, único idioma antigo ainda incluindo no plano. Seguindo a tradição que vinha do Império, consideraram-se línguas obrigatórias o francês e o inglês – aquele, a ser estudado em nove aulas hebdomadárias (3+3+2+1, da primeira à quarta séries); e este em oito horas (3+3+2, da segunda à quarta séries) – com um total de dezessete aulas por semana. (CHAGAS, op. cit., p.110)

Infelizmente, a falta de condições específicas, como a formação de professores, impossibilitou a execução plena deste projeto que impulsionaria o ensino de línguas no Brasil. Entretanto, mesmo com estas adversidades, a Reforma Francisco Campos possibilitou a realização, no Colégio Pedro II, de uma experiência considerada magnífica e sem continuadores no âmbito da educação básica, como assinala Chagas (op. cit). Exemplo desse avanço é a elaboração de Instruções que normatizariam o ensino de LE nesta instituição organizado pelo professor Carneiro Leão :

(...) o ensino teria “caráter nimiamente prático” e seria “ministrado na própria língua”, “adotando-se o método direto desde a primeira aula” (art. 1º), o sentido das palavras deveria ser transmitido não pela tradução, mas “pela ligação direta do objeto à sua expressão completa e inteligível” (art. 2º, § 1º), o que se conseguiria “por meio de quadros e demais objetos que sugerissem assuntos para o diálogo” (art. 4º); a língua a ensinar seria “a atual, corrente” (art. 2º, §1º), e só excepcionalmente” poder-se-ia “recorrer à língua portuguesa” ( §3º); a aprendizagem obedeceria à sequência de “ouvir e falar, ler e escrever” (art. 5º); a pronúncia seria aprendida não apenas por imitação, mas também, e sempre que aconselhável, pelo estudo sistemático dos sons mais difíceis (art. 6º); as noções gramaticais deveriam “ser deduzidas pela própria observação dos discentes e nunca apresentadas sob a forma teórica ou abstrata de regras” (art. 11º); a leitura seria feita nas obras dos autores indicados (arts. 15º, 31º, 32º e 33º) e em “jornais, revistas, almanaques ou quaisquer impressos redigidos em boa linguagem” que possibilitassem aos alunos conhecer o “idioma atual do país” e pari passu, “inteirar-se dos assuntos ao mesmo concernentes” (art. 14º); a prova escrita constataria de “tradução e de um exercício de redação” (art. 28º), com permissão do “uso do dicionário” ( §1º), e a oral abrangeria “leitura e tradução de um trecho, comentário sobre o autor, além de perguntas de matéria gramatical” (art. 29º, §1º), empregando-se exclusivamente “ a língua estrangeira”( § 2º) ( CHAGAS, 1957, p.112-113).

Considerações Finais

Diante do exposto nas seções anteriores, buscamos evidenciar o Colégio Pedro II como uma instituição considerada como lugar de memória do ensino de línguas no Brasil. Considerando-o mais que um patrimônio material do Rio de Janeiro, um símbolo das iniciativas pioneiras com relação ao estabelecimento do ensino secundário em nosso país, e, além disso, talvez a instituição que dispendeu o maior esforço pela implementação do ensino de língua estrangeira.

Dessa forma, o Colégio Pedro II consegue registrar e preservar a memória de uma parte da História da Educação do Brasil, especialmente do Ensino de Línguas, que precisa ser evocada a fim de fazer sentindo aos nossos dias da importância que as línguas têm no currículo escolar, como já assinala a atual Lei de Diretrizes e Bases (1996).

E, para isso, faz-se necessário propor investigações que dialoguem com a história dos professores, a relação professor–aluno, as disciplinas, os diversos suportes (materiais didáticos, arquivos, os planos de aula, os cadernos), entre outros, no intuito de melhor compreender os caminhos percorridos e trilhar novas rotas. Este trabalho propõe uma contribuição inicial para essa trajetória.

Referências

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  • ALMEIDA FILHO, J. C. P. de. Ontem e Hoje no ensino de línguas no Brasil. In: STEVENS, C.M.T e CUNHA, M.J. Caminhos e Colheitas: ensino e pesquisa na área de inglês no Brasil. Brasília: UnB, 2003. p.19-34.
  • ANDRADE, V. L. C. Histórico do Colégio Pedro II. Disponível em: http://www.cp2centro.net/historia/historia/historia.asp?data= 16/11/2011 %2017:58:58. Acesso em: 15 nov. 2011.
  • CHAGAS, V. Didática especial de línguas modernas. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1957.
  • LE GOFF, J. História e Memória. Tradução Bernardo Leitão, et all. 2° Ed. Campinas: UNICAMP, 1992.
  • MOISES, A. F. de A. M.O COLÉGIO PEDRO II: CONTROVÉRSIAS ACERCA DE SUA FUNDAÇÃO, Tese de Doutorado. Maringá, PR: Universidade Estadual de Maringá, 2007. Disponível em: http://www.multiculturas.com/boarding_school/library/AMoises_fundacao_colegio_Pedro_II_2007.pdf. Acesso em: 15 nov. 2011.
  • NORA, P. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Tradução Yara Aun Khoury In. Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduação em História e do Departamento de História da PUC/SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) São Paulo, SP-Brasil, 1993, p.2-28. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/63990008/Pierre-Nora-Entre-Memoria-e-Historia. Acesso em: 15 nov. 2011.
  • PINSKY, Carla Bassanezi. (Org.). Fontes históricas. São Paulo: Contexto , 2005.
  • TEIXEIRA, Anísio. Ensino superior no Brasil: análise e interpretação de sua evolução até 1969. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1989. 186p..